sábado, 29 de novembro de 2008

Body of Lies, outra vez o Médio Oriente



Nem de propósito, coincide este filme, a saga da presença dos EUA no Médio Oriente, com os sangrentos acontecimentos de Bombaim. Um duelo entre Mr. Hoffman (Crowe) e Ferris (DiCaprio), apesar de tudo necessariamente duas visões diferentes: o primeiro com a arrogância característica de quem está em Langley, naturalmente distante da frente de combate mas arrogante pelo facto de dispôr de informação, revelando uma total incompreensão pela hostilidade no terreno, pretendendo impôr uma visão do mundo, a partir dos interesses americanos, naturalmente ímpios face ao radicalismo islâmico que assume o combate, em qualquer lugar do mundo, transpondo o sentimento de insegurança para espaços muito distantes da frente de combate (o Iraque), seja em Amã ou Amesterdão; o segundo, ainda que operacional experiente, tem, também por causa disso, uma visão diferente da forma como se abordam as questões, que mesmo em matéria estritamente operacional, que define de forma ténue a diferença entre a vida e a morte, relecte uma compreensão romântica do problema e di-lo de forma clara, já perto do fim, quando confrontado com a insinuação de estar contra a América responde a Hoffman para ter cuidado com a sua generalização sobre o país, devendo medir o alcance de uma apropriação tão abusiva.


Lembra este duelo, em termos clássicos, a divergência sempre presente entre os analistas de informação, as suas projecções e construções de realidades, sejam as fontes mais ou menos credíveis para podermos delinear uma fita do tempo e encadear os acontecimentos, e os operacionais e investigadores que do terreno trazem pormenores nem sempre ao alcance de quem, à distância, não percebe alguns dos contornos da realidade, por mais tecnologia que se domine.


É extremamente curioso ver como dois mundos ligados a desenvolvimentos tecnológicos diferentes conseguem atingir os seus objectivos, de um lado os radicais islâmicos apegados a uma tecnologia por vezes incipiente (ainda que com acesso à internet e na posse de telemóveis) com uma inesgotável capacidade de diluição entre as suas comunidades, confundindo tudo e todos; e do outro, em contraposição, um mundo na posse de tecnologia do século XXI, mas incapaz, ainda que pontualmente, de travar a actuação destruidora de uma máquina de guerra que utiliza essencialmente o ser humano (com uma inacreditável lavagem cerebral) como a principal arma de guerra: o martírio é espiritualmente recompensado e a passagem pela Terra é apenas um meio para atingir esse fim.

Sobre Hoffman é importante dizer que está no Médio Oriente, o problema é que não aprende a lá estar e talvez fosse útil começar por aí.

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